quarta-feira, 20 de março de 2013

Uma maratona qualquer...


Começou. A buzina me diz isso e esse mundo se movendo à minha frente, idem. Mas, epa, espere aí! Tem mais um monte de gente vindo aí atrás também. Será que eu estou preparado? Será que treinei o bastante? Acho que vou desistir... Afinal, foram “só” dezesseis semanas de treino, fora a base. É “só” recomeçar tudo de novo do zero. Mas que desistir, que nada! O importante é terminar, seja com o tempo que for. Mas então por que cargas d’água eu estou indo tão rápido? Menos de quinhentos metros de prova e eu aqui, já com um palmo de língua para fora. Vou diminuir o ritmo... Mas só um pouquinho, porque também não quero chegar lá na rabeira.


Km 1. Algum engraçadinho metido a professor de matemática sempre faz as contas e diz quanto está faltando. Deixe estar, lá pela frente, ele não vai lembrar mais nem quanto é 2 + 2. O ritmo não foi bom. Quero dizer, foi ótimo. Mas foi forte demais. Se eu continuar nessa toada, quebro bonitinho. Mas o dia está tão bonito... Quero dizer, está nublado, cinza, com cara até de que vem chuva aí. Será? Mas está gostoso demais para correr. Acho que vou acelerar. Não, melhor deixar pra lá. Vamos esperar.






Km 5. Já bebi água, mesmo sem sede nenhuma. Pensei em abrir o primeiro sachê de gel, mas a programação era só com o dobro dessa distância. É que o bolso está tão pesado, chacoalhando, que deu vontade de aliviar um pouco o peso. Achei um ritmo mais confortável, embora ainda não esteja correndo dentro da programação. Fiquei a alguns míseros segundos de bater meu recorde da prova curta. Acho que vou quebrar desse jeito.



Km 10. Que maravilha ver a primeira placa com dois dígitos. E pensar que um dia achei essa distância inatingível. Hoje, ela é só o aquecimento. Meu corpo já entendeu o recado, a batalha vai ser dura. Mas está em equilíbrio, adorando cada passada. Já não corro mais feito um cavalo doido, achei o meu “modus correndi” e vou seguir nele enquanto puder. Se estivesse na proa de um navio, abriria os braços e gritaria que sou o rei do mundo.








Km 21. Já experimentei tudo o que tinha nos bolsos e o que a organização me ofereceu. Chego à metade do caminho, ergo um dedo para o céu e enxugo uma lagrimazinha que quer teimosamente se formar. Não é hora de emoção, a jornada é longa e há que se manter a concentração. Mas estou feliz. E inteiro. Se dobrar esse tempo até aqui, chegarei explodindo de alegria. Foco, foco, foco...





Km 30. Ou 32. Ou 35. Estou cansado, mas conheço perfeitamente meu corpo e minhas reações até aqui. Fiz isso nos treinos. Minhas pernas doem, embora meu coração e pulmões pareçam intactos. Escapei ileso de uma ou duas ameaças de cãibra. Acho que a gororoba que me receitaram funcionou. Ou será que isso tudo é psicológico? Deixa pra lá... Falta pouco. Dou uma caminhada para aliviar? Estou louco!?!? Sigo em frente. Sem a toada forte do começo, mas com muito mais valentia.







Km 31. Ou 33. Ou 36. É esse o tal “urso” que monta nas costas? Ah, no máximo é um coala... Ah, se não fosse tão tarde... Ah, se o sol não tivesse saído... Ah, se eu não estivesse com tanta fome...











Km 40. A visão dessa placa é como a de um oásis no deserto. Será miragem? Como custou a chegar... Estou quase lá. Vou acelerar. Não, calma aí, é cedo. Seguro minha onda. Mas não demais também. Entregar os pontos, nem pensar. Que dor é essa na panturrilha? Por que meus pés estão quentes desse jeito? O que estou fazendo aqui, afinal? Nunca mais faço uma besteira dessas...








Km 42. Não existe mais dor. Nem cansaço. Ouço meu nome em timbres desconhecidos e nem me dou conta que é porque ele está impresso em meu peito. Ouço aplausos e incentivos, como se quem estivesse chegando fosse um campeão. E não sou? Embalado, acelero pelos 195 metros finais como se eles fossem os iniciais. Tenho os olhos marejados, o coração disparado e uma vontade imensa de gritar para o mundo inteiro que estou chegando. Há um relógio enorme à minha frente, mas os números que ele mostra já não têm mais tanta importância para mim.





Km 42,195. Cheguei. Minhas pernas e minha alma me trouxeram até aqui. Estou destruído, mas trago no peito uma felicidade e um orgulho que mal consigo explicar. Quando é a próxima mesmo?


14 comentários:

  1. Fábio, parabéns pelo texto, me emocionou, aliás, como todos que tu escreve. Me identifiquei muito com ele, pois estou na segunda semana das a7 da minha planiha de treinamento. E sei bem como é encarar uma empreitada dessas.

    Abração!

    http://ironmangfbpa.blogspot.com.br/

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    1. Obrigado, Ademir. Pela excepcional participação e resultado na meia, percebe-se que a preparação está no caminho mais do que certo. Siga por ele.

      Abração, obrigado pela visita e mensagem.

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  2. Excelente texto Fábio. Gostei mesmo.

    Eu também, até alguns meses atrás, achava 10 km inatingível. Hoje já corro mais que isso. Oficialmente a minha primeira prova de 10k será no próximo domingo. Planejo uma meia maratona para outubro e uma maratona para o ano que vem.

    Tenho acompanhado seu blog e gosto muto dos relatos.

    Abraço!

    Douglas
    corridaporprazer.blogspot.com.br

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    1. Obrigado, Douglas. Ainda bem que o conceito de inatingível é bastante maleável, o suficiente para que possamos moldá-lo com o tempo e a preparação.

      Boa estreia oficial nos 10k. E sucesso na sua caminhada rumo às distâncias maiores.

      Abraço e obrigado por acompanhar o blog.

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  3. Samurai muito legal seu texto..ainda vou experimentar todas essas sensações!..rs

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    1. Tenho certeza que sim, xará. Você vem mostrando, mesmo com o seu pouco tempo de corrida, muitas virtudes. Inclusive uma grande determinação. Vai que vai, maluco do asfalto!

      Abração.

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  4. Namiultra,
    estou treinando com afinco para encarar os 42k em outubro.
    Minha maior dificuldade até agora ? O psicológico...,mas eu chego lá.
    Abraço e bons treinos!!

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    1. Não poderia ser diferente, caro amigo Jorge. Os 42 são uma prova MUITO mental. Mas conheço bem a sua garra e dedicação aos treinos e tenho toda a convicção de que você chega lá. E chega bem. Siga firme, nos treinos e na preparação.

      Abraços!

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  5. Belo texto Japa! Aquela foto da Marli nos 42 é de chorar mesmo.
    Espero que você venha no RJ. Uma maratona com você é bom demais. E você está na frente no placar.

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    1. Valeu, parceiro! Não conhecia a foto, só a história da Marli. E fiquei comovido o bastante para simbolizar o parágrafo com a imagem, uma das mais emblemáticas que já vi.

      Teoricamente, a maratona rola uma semana depois da ultra, o que tornaria meio inviável a brincadeira. Mas quem sabe... Qualquer que seja o placar, é sempre muito bacana um novo round.

      Abraço!

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    2. Essa é presidencial... Obrigado!

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  6. Muito bom esse texto, faço suas as minhas palavras e lógico ainda não cheguei ao 42 Km mas a metade sim e ao ler erra texto cheguei a me emocionar...
    Parabéns e obrigado, hj já tenho um "link" para demostrar aos amigos oq eu sinto + ou -

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    1. Obrigado, Cake! São palavras que retratam os sentimentos de quem já correu algumas, aprendeu um pouco com elas, mas nunca vai deixar de se emocionar a cada nova largada, chegada ou preparação.

      Abraços!

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