sábado, 24 de agosto de 2013

Treino PL62 - O(s) guarda-costas

Dizem por aí que corrida é esporte solitário. Eu discordo. Individual sim, exceto nos revezamentos; na pista, fio, é cada um por si e um contra todos. Mas, ao contrário de muitas outras modalidades, não precisa haver um perdedor para que outro vença. Cada um no grid de largada tem o seu objetivo; e atingi-lo tem significado de vitória pessoal. Podemos torcer — e torcemos — uns pelos outros. Assim, sem rivalidades, ou mesmo com elas, mas não exacerbadas ao extremo, o individual vira coletivo. E solidário.


Só sei que é assim...
Em treinos, então, isso se destaca ainda mais. Correr sozinho, no seu próprio ritmo, é bom e necessário, não dá para fugir disso. Mas prazerosos mesmo são os treinos conjuntos. Com mais um, dois ou dezenas de amigos, os coletivos são o que de melhor há nesse mundo corrido. Ainda que estar neles signifique sair totalmente da sua rotina (e velocidade). Ninguém é obrigado a tirar o pé ou puxar o freio de mão para não deixar os colegas para trás, cada um corre como bem entender nas brincadeiras que fazemos, nas noites de quarta-feira ou, eventualmente, aos finais de semana também. Mas, quem não se permite de vez em quando reduzir a marcha, não tem ideia do bem que faz a um companheiro de esporte. Ter a chance de ajudar alguém é sempre muito gratificante.


Um dia ainda quero ter a experiência
Quando meu amigo Jorge Monteiro contou em seu blog (http://corrersemprecorrer.blogspot.com.br) que tinha marcado para o sábado o seu primeiro treino de 30 km, etapa importante de sua preparação para a estreia em maratonas, prevista para outubro em Buenos Aires, não pensei duas vezes. E me ofereci na mesma hora como pacer voluntário. Corredor experiente, com várias meias maratonas no currículo, ele vem treinando firme e solo para os primeiros 42k. Mas companhia, num longão interminável desses, a gente sabe o quanto é bem-vinda. Convoquei também para a missão a valente dupla de Antônios (Toninho & Tonico) e, pouco depois das sete, partimos para o desafio. Nanci, que esteve conosco no Treinão da Fé em julho, também apareceria para uma participação especial.




Designado para a tarefa de montar o percurso, tentei não inventar muito, manter caminhos bem conhecidos de outros treinos e provas. E aproveitar o começo da manhã, ainda com temperatura amena, para concentrar todas as eventuais dificuldades na primeira parte. Seguimos do Colinas em direção ao Esplanada do Sol, um apêndice que gosto de colocar nos trajetos para esticar a pernada (três quilômetros em ida e volta) e acrescentar um bocadinho de terra em plena área urbana.


Terra de contrastes
Depois do passeio rural e da primeira subida, da ponte seca que liga a região do condomínio ao restante da cidade, seguiríamos para a zona central pelas avenidas Anchieta e Borba Gato. Aclive suave, mas permanente, com vista privilegiada para o Banhado, nosso cartão postal joseense e palco também de nossos treinos, uma vez por ano. Tão bonito que (quase) faz esquecer o perrengue da "escalada".

Patrimônio
Dali, um estirão para a zona norte e seu novo caminho, a Avenida Prefeito José Marcondes Pereira, que todos chamam de Via Norte. Nova darling dos nossos organizadores de corridas locais, arena de muitas provas recentes por aqui. Chegar lá é bom; estar lá, em sua longa (2 km) pista de caminhada com ciclovia paralela, idem. Duro é voltar. Ô morrinho matador! Mil e seiscentos metros rampa acima, de castigar.


Quando tem mais gente pra dividir o sofrimento, até que é bom...
No começo, tudo estava lindo. Com perfeitas temperaturas sub-20ºC e paces altos para os meus padrões, bem acima dos seis ou até dos sete minutos por quilômetro, o coração batia em compasso confortável. O monitoramento em tempo real mostrava 110, no máximo 120 BPM. Contudo, já na volta ao centro da cidade, o panorama começaria a mudar. As nuvens se dissipariam, jogando o termômetro lá para o alto e a sensação de passeio no parque logo daria lugar à outra, de esforço bem maior.


Puf, puf, puf...
Tonico e Nanci, que haviam disparado à  frente no comecinho, haviam sido alcançados na chegada ao Rio Paraíba e sumiriam na volta. Seguíamos em trio, o mesmo de vários outros treinos pregressos, desde a época em que o Jorge não conseguia correr e falar ao mesmo tempo (o cara evoluiu MUITO!). O conversê estava animado e até um "lanchinho" já tinha rolado, com barrinhas de cereal levadas pelo Toninho. Mas, com quase 19 km rodados e apenas a volta do Urbanova por fazer, algo meio estranho aconteceria...


Hein?
Não, não me senti mal. Só bateu um cansaço meio repentino. Explicável talvez pelas noites de pouco sono durante a complicada semana que passei, com problemas de saúde na família. Só por curiosidade, fui dar uma nova espiada na telinha do frequencímetro. E me assustei com o valor que ele mostrou. Cento e cinquenta e poucos batimentos por minuto não é nada demais; pelo menos não para quem está correndo em um ritmo costumeiro. Mas um exagero para alguém muito abaixo de sua velocidade de cruzeiro. Cauteloso, parei na mesma hora. Os amigos voltaram para perguntar se tudo estava bem. Respondi que sim e mandei que continuassem sem mim. Sentei na muretinha e esperei a pulsação voltar ao normal. Em poucos segundos, já estava na casa dos oitenta. Tudo certo comigo... A-e-i, vão ter que me engolir!


Não treino sem eles
Poderia até dar um pique e alcançar a dupla. Mas preferi pegar o caminho de volta, observando atentamente o comportamento da velha bomba que habita o peito. Correndo um pouco mais forte do que estava até então, na casa dos 6'/km baixos, vi que o número não passou dos 140 BPM. Tranquilizei-me de vez. Com a garrafinha vazia, entretanto, desanimei de continuar o trote. Tinha pouco mais de 20 km rodados e me dei, momentaneamente, por satisfeito. Fui até o hipermercado, próximo do ponto de largada e reabasteci com água geladinha do bebedouro. Renasci.


Insípida, inodora, incolor... E insubstituível!

Até sentei no ponto de ônibus na lateral do shopping e fiquei esperando a chegada dos amigos. Mas fiz as contas e constatei que eles ainda deveriam demorar bastante. Apesar do calor, com temperaturas já próximas dos 30ºC e uma umidade relativa do ar claramente baixa, decidi voltar a campo para um terceiro tempo. Fiz bem. Não só aumentaria minha rodagem própria para 26 km, mas sobretudo participaria do "resgate" ao estreante nas longas distâncias. Presenciar in loco a sua alegria ao vencer mais esse desafio, quebrando seu recorde pessoal de rodagem e se credenciando de vez para a marvada portenha foi uma grata vivência. Ele disse que não teria conseguido sem a gente. Não o tornamos capaz, só ajudamos a provar que era. Você está no caminho certo, amigo!


É guerreiro. E vai brilhar
O lanche pós-treino foi saboroso. O papo também. E ainda recebi por telefone a notícia de que meu sogro havia tido alta hospitalar, menos de uma semana depois de sua cirurgia cardíaca. Apesar do pequeno susto (ou excesso de zelo, para quem preferir) comigo mesmo, uma bela manhã de sábado. Domingo tem mais emoções.

Acabou mudando um pouco na prática, mas foi mais ou menos isso aí

6 comentários:

  1. O mais importante e que deu tudo certo no final, e acho que realmente foi muito importante pra Ele ter treinado em conjunto. tbm penso que se eu fosse fazer 25 km sozinho não iria chegar, (talvez desistiria) Equipe e isso ai! otimo exemplo! Parabens a todos.. minha vontade era estar com vcs... Mais ainda quero um treino 30 km ou talvez 32... que a volta ao banhado.

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    1. Verdade, Helber. 30 km são sempre uma distância "de responsa" e foi uma grande satisfação ajudar o amigo Jorge a alcançá-la, vencendo mais uma etapa de sua preparação para a maratona. Contamos com a sua presença quando estiver pronto para encarar (e for a hora disso). Está a caminho, pelo que já pudemos ver. Abraço!

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  2. NamiULTRA,
    mais uma vez muito obrigado pela força que vc, Toninho, Tunico e Nanci me deram.
    Correr "alone" longas distância é complicado,25 km já foram e ontem foram mais 30km,dia 14 de setembro tem mais 35km, vamos ?rsrs
    Ontem o dia combinou alta temperatura + baixa umidade + subidas "ardidas",um bom teste e ao mesmo tempo um dia duro para correr longas distâncias.
    Grande abraço, meu amigo!!

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    1. Valeu, meu amigo. Foi uma satisfação estar ao seu lado na maior parte destes 30 km. No dia 15 vamos subir o Pico do Itapeva, então não temos como fazer a dobradinha. Mas temos certeza de que você, com sua garra e disciplina, vai vencer mais essa etapa e chegar firme e forte para a estreia na "marvada". Vai que é sua!!!

      Abração e bons treinos.

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  3. Não descarto pelo menos uma rodagem semanal sozinho. Faço isso para correr no meu ritmo e, também, para colocar a mente em ordem (como é bom fazer isso correndo).

    Mas, nesse ponto, acho que somos parecidos Fábio. Gosto muito dos treinos em grupo. São neles que me divirto mais. E é sempre muito bom ajudar um amigo. Esses dias fiz um treino com uma amiga que vai estrear nos 21k em Buenos Aires. Era relativamente fácil para mim (10km intervalando cada km para 6'30" e 7'30", com tiros de 500m entre cada km), mas ela quando ficou super angustiada quando o professor passou a meta, na hora até falou que nunca conseguiria. Pedi para ir junto marcando as distâncias com e controlando o ritmo com o GPS. Ela sofreu um pouco no final, mas conseguiu e no fim me agradeceu muito pela ajuda. Para mim valeu o dia.

    Agora, quanto ao cansaço anormal que você sentiu, mesmo não tendo tanta experiência, acho que você fez super certo de parar e se hidratar antes de continuar. Cautela nunca é demais.

    Abrçs e bons treinos

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    1. Concordo, Danilo. Treinos solo são fundamentais, já que as provas geralmente assim são também. E até prazerosos, à sua maneira, justamente por permitirem esse "zen-corrismo".

      Mas os coletivos são incomparáveis. As amizades são melhor efeito colateral da corrida. Seja guiando ou sendo guiado, podendo colocar o papo em dia ou quase colocando os pulmões para fora. Treinar com amigos é o que há!

      Mais vale um "covarde" vivo do que um herói morto, essa é a minha máxima. E vem dando certo até aqui... ;-)

      Abração!

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